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Prof. Amanda Lacerda de Lacerda

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1º ano EM 

Resenha - O Auto da Barca do Inferno

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Ao longo do 2º período das aulas de Literatura do 1º ano do Ensino Médio, realizamos a leitura da peça teatral O Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente, comoparte dos estudos da Literatura no Humanismo. Com base na aproximação com personagens tipológicos inseridos em um contexto humorístico, mas também bastante provocadores em sua época, proporcionada pela leitura literária, os alunos elaboraram uma leitura crítica, em formato de áudio, demonstrando sua interpretação sobre a obra. Tomando como eixo o tema centra, a forma do texto teatral, a apresentação do contexto histórico do autor e o foco na observação de um personagem, os estudantes foram também instigados a buscar as relações dessa obra consagrada em seus possíveis contatos com a atualidade.

Fanzine: leitura criativa da obra Os Lusíadas

 

A palavra fanzine nasceu da redução fônica da expressão fanatic magazine. Ela provém da combinação do final do vocábulo “magazine”, que tem o sentido de “revista”, com o início de “fanatic”. Trata-se de um veículo editado por um fã, seja de graphic novels, obras de ficção científica, ou de poemas, músicas, filmes, videogames, entre outras temáticas incorporadas por estas publicações. São elaboradas por admiradores de certo assunto para pessoas que compartilham a mesma paixão. Eles podem ser peritos neste campo ou simples entusiastas. 

Os fanzines foram muito disseminados no continente europeu, em especial na França, ao longo das revoltas de 1968. Aqui, no Brasil, a palavra se tornou sinônimo de publicação livre no cenário underground dos anos 80. 

Os estudantes de Literatura do 1º ano do Ensino Médio, após a leitura da obra Os Lusíadas, em sua versão HQ, elaborada por Fido Nesti, foram convidados a recriar, pela linguagem multimodal, própria de um fanzine, uma expressão autoral de suas leituras desta epopeia clássica em Língua Portuguesa.

Fanzine ''Os Lusíadas'' Fabricio Sabino
Fanzine ''Os Lusíadas'' Eduardo Néris, J
Fanzine ''Os Lusíadas'' Maria Luiza, Vit

Conto

 

O estudo dos gêneros narrativos nas aulas de Produção de Texto do 2º período de 2020 buscou proporcionar aos alunos o conhecimento dos conteúdos e das formas dos textos literários em prosa por meio da produção de contos. Os que estão aqui selecionados foram produzidos por toda a turma a partir da seguinte proposta:

Suponha que, em determinada época, o divertimento da moda entre jovens era, em grupo, se aventurarem em passeio noturno num cemitério. Numa dessas ocasiões, algo absolutamente inesperado ocorreu, motivando muita curiosidade sobre o episódio e suas consequências.

Os estudantes demonstraram um uso inventivo e apropriado das categorias narrativas, invertendo as perspectivas, hibridizando gêneros e explorando o imaginário, além de uma observação crítica sobre as estruturas que sustentam a escrita da ficção. Esperamos que gostem dessa leitura

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"Suponha que, em determinada época, o divertimento da moda entre jovens era, em grupo, se aventurarem em passeio noturno num cemitério. Numa dessas ocasiões, algo absolutamente inesperado ocorreu, motivando muita curiosidade sobre o episódio e suas consequências."

ESTADÃO DOS MORTOS

Vitor Fadul

 

Aqui na cidade de Penápolis, no interior de São Paulo, as férteis imaginações dos jovens não têm limites. O sinal de telefone ainda é muito falho na região e as populares brincadeiras tecnológicas da metrópole ainda não tiverem vez em cidades interioranas.

A infeliz e aterrorizante mentalidade adolescente assombra as mais diversas áreas  cidade, sem exceções. Invadem as fazendas da região, amarram o rabo dos cavalos e disseminam a assustadora lenda do Saci para as ingênuas crianças. Para assustar os vizinhos,

colocam biribinha debaixo dos tapetes de entrada das casas alheias e ficam escondidos só esperando os moradores pisarem sobre as bombinhas. São coisas assim que avassalam o ar pacato de Penápolis e destroem qualquer tipo de tranquilidade existente.

Mas as brincadeiras não param por aí, elas vão até o cemitério extinguir a paz dos mortos. Convenhamos que a vida já é bastante farta de problemas e irritações e a morte um lugar calmo e tranquilizante, pelo menos para os que não queimam no inferno. Eu devo ter assado a pomba branca da arca de Noé para ser enterrado justo no cemitério mais sombrio do mundo. Para aqueles que não sabem, todas as semanas os mortos do cemitério realizam um encontro para jogar uma partida de cacheta, é uma diversão sem fim, principalmente depois que o Bezerra da Silva morreu, ele é gente-finíssima, toca um samba inigualável, vem pra cá sempre que pode, ainda mais depois que enterraram sua sogra na cova ao lado. Mas toda essa felicidade tinha os dias contados. Desde a puberdade da geração mais jovem de Penápolis os aterrorizantes

fantasmas passaram a ser aterrorizados.

Funk alto nas madrugadas, gomas de mascar nos túmulos alheios, palavrões descontrolados, rasgavam os jornais “Estadão dos Mortos” que recebíamos, roubaram até a flor que deixaram no meu caixão! A gente até tentou assustá-los, mas eles não deram a mínima. As tão estimadas noites de cacheta foram perdendo seus integrantes, Bezerra da Silva voltou para o Rio de Janeiro, meus amigos de décadas passaram a optar pelo aconchego de suas lápides, eu chamei um serviço de caixões antirruídos para vedar os sons emitidos por estes monstros e assim, o Cemitério Penapolense foi se transformando em uma eterno dia de domingo.

Foi no dia 31 de março de 2020, durante uma severa quarentena em todo o país, que ocorreu o estopim, uma aglomeração, pronta para disseminar o novo coronavírus. Minha pressão caiu, tornei-me ainda mais branco. Sons perturbadores de espirros, tosses tenebrosas, só conseguia imaginar o horrendo aumento em número de mortos, uma superlotação nos cemitérios seria o fim eterno da minha paz. Peguei minha trouxa de roupas e em uma deprimente despedida, saí de casa, minha companheira de anos, um dos maiores amores da minha morte, busquei um lugar com poucos habitantes, pacato como um dia já foi Penápolis, depois de dias de viagens, cheguei ao Pantanal, montei uma linda lápide, fui um dos pioneiros do Cemitério Pantaneiro e por lá me aconcheguei. Meses depois fui surpreendido por uma infeliz queimada proliferando gás carbônico e atacando a asma que me atormenta desde a vida, lá vou eu à uma triste despedida...

Mais uma noite no cemitério

Isabella Morgado

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Estive no cemitério. Contemplava a arte das lápides e anjos em gesso que guardavam os corpos dos falecidos e lhes traziam finalmente paz. Todas as noites passava para caminhar na escuridão de um lugar considerado sombrio. Ali conseguia me desligar de todas as multidões de pessoas hipócritas que rondavam o bairro de minha casa.

Sempre fui muito quieta e nunca gostei de muitas pessoas juntas. Isso me causava ansiedade. Indo ao lugar mais silencioso da cidade, talvez a ansiedade passasse. Me diziam que meditar faz bem, mas lhe digo que caminhar no cemitério é melhor ainda.

Pelo menos até a última sexta-feira do ano. Na qual muitas pessoas de minha família acreditam ser assombrada. !Ir ao cemitério nesta data pode lhe trazer má sorte, como um espelho quebrado", me diziam com toda fé. Eu nunca acreditei.

Porém foi apenas esse dia chegar, para perceber que cada um tem seu azar. E o meu foi encontrar jovens brincando com espíritos no cemitério. Parece que essa é a nova “onda” entre os adolescentes.

Eles seguravam garrafas de bebidas e fumavam cigarros como se pudessem. Nada os impedia lá dentro. Eu os observava brincar e não achava graça, enquanto as garotas riam como gazelas.

Quando me atentei ao horário, hora grande, já não dava mais para sair de lá. Os portões estavam fechados e eu presa lá dentro com jovens desrespeitosos.

Continuei a observar, até que um deles conseguiu me ver. Infelizmente. E por tudo que me vinha na cabeça o que ocorreu era o que menos esperava. O garoto levantou e veio em minha direção com a feição séria. Não tinha reações a não ser olhar para ele e pensar o porquê me olhava com tanta fixação.

O garoto chegou bem perto e sentou-se ao meu lado, perguntando o motivo da minha visita ao cemitério. Não quis lhe contar o real motivo e apenas lhe disse que não conseguia dormir e não tinha nada melhor para fazer.

Conversamos por alguns minutos, o garoto se levantou, pegou em minhas mãos e me convidou para jogar com ele e seus amigos. Eu, sem entender nada, aceitei. Pela primeira vez consegui socializar.

Já eram quase três horas da manhã e o celular tocava sem parar, era minha mãe. Por algum motivo ela estava atrás de mim. Então decidi que iria fugir do cemitério, aquela era uma experiência nova para mim.

O garoto decidiu me acompanhar e, quando chegamos na frente da minha casa, o garoto me deu um beijo suave e foi embora.

Nunca mais soube dele, só sei que sentirei falta daquele dia.

Susto no cemitério

Erik Matthias

 

Vou contar para vocês leitores sobre a vez em que achava que nunca mais iria ver o meu melhor amigo de novo.

Estava rolando uma brincadeira onde um grupo de jovens teria que se aventurar em um passeio noturno em um cemitério. De acordo com Júnior, o mais corajoso, nada de mal ia acontecer comigo ou com nossa turma. Apesar da minha intuição dizer o contrário, fui convencido. Contei para meus pais, que não concordaram com a ideia e não me deixaram ir. Porém, determinado, sai pela janela e fui em direção ao cemitério.

No meio do caminho encontrei Arthur, meu melhor amigo, que era um cara muito brincalhão e que adorava uma pegadinha. Ele estava tremendo de medo e de

frio. Apesar de tentar confortá-lo, mal sabia ele que eu também estava com medo.

- Sabe, ouvi boatos que pessoas nunca saíram de lá – afirmou Arthur, com uma voz trêmula. Já havia ouvido sobre esses boatos, e ao lembrar deles, fiquei com mais medo e tentei me acalmar rápido, pois havíamos chegado no cemitério.

No instante que entramos no lugar assombrado, o portão de entrada se fechou atrás de nós e todos pularam de susto, até o Júnior.

- Deve ser defeito do portão – disse Júnior, tentando se convencer.

Caminhamos um pouco dentro do cemitério, quando sentimos a falta de Arthur.

- ARTHUR!! – todos decidiram gritar, mas ninguém respondeu.

Em nenhum momento ouvi ele se distanciando do grupo, ele simplesmente havia sumido, mas não desistimos da busca, continuamos a procurar. Bem que Arthur estava certo sobre os boatos...

Em um dos cantos, vimos uma sombra se aproximar, e saímos correndo todos juntos até pararmos em um corredor sem saída. A sombra se aproximou e pensei, “esse será meu fim”. A sombra ficou cada vez mais perto, e fechei os olhos para não ver a assombração, pronto para encontrar meu destino. Esperei de olhos fechados, mas nada aconteceu. Decidi abri-los um de cada vez, com medo do que iria ver. Era apenas Arthur, com mais uma de suas brincadeiras. Depois deste ocorrido, todos voltaram para suas casas aliviados, prontos para dormir e esquecer o susto. No meu caso, meus pais acabaram descobrindo que sai de casa escondido e fiquei de castigo por uma semana, mas valeu a pena a aventura, mesmo que ninguém nunca quisesse entrar no cemitério à noite de novo, nem mesmo Júnior.

2º ano EM 

Resenha do romance Quincas Borba – 2º ano EM

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Quincas Borba (1891), de Machado de Assis, é uma narrativa de grande sofisticação da literatura brasileira. Lida com os olhos de hoje, a história da personagem Rubião pode nos parecer enfadonha ou datada, mas as críticas que revela acerca de temas como dinheiro, amor e loucura já cessaram na atualidade?

Esta é apenas uma das inúmeras indagações que a narrativa nos proporciona, algumas delas foram suscitadas pelos alunos do 2º ano do Ensino Médio e discutidas em suas resenhas críticas. Boa audição!

Fanfic: mulheres nas obras de Machado de Assis

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Já ouviu falar em fanfic? Própria dos meios digitais, a fanfic é uma história ficcional produzida por um fã que, sem pretensões de ferir direitos autorais ou de lucrar com suas produções, cria uma narrativa paralela, empregando personagens ou outros elementos do enredo de um original notável. Normalmente envolve personagens de produções midiáticas, como cinema, literatura, HQ, videogames, animês, mangás e até celebridades.

Ao longo das aulas de Literatura no 2º período deste ano, os alunos tomaram contato com a obra de Machado de Assis e produziram uma fanfic inspirada em suas personagens femininas. Sofia, Marcela, Capitu, Dona Plácida, Virgília, entre outras, foram colocadas em diálogo e em diferentes contextos. Os estudantes demonstraram uma grande habilidade para recriar histórias, apropriando-se ainda mais das obras de Machado, seu ponto de partida, e com ela produzindo uma reflexão sobre os deslocamentos narrativos.

A VERDADEIRA FACE DE CAPITU

Maria Júlia e Gustavo Arbex – 2º A

 

Quando vocês tiveram acesso a meu diário, não estarei mais aqui. E não me procurem. Tudo que eu tinha para dizer será posto aqui. Sem ressalvas.

 

9 de setembro de 1900

Hoje veio à tona o que Bentinho pensa sobre mim. Sempre fui muito esperta, nunca deixei claro se estava ou não com Escobar. As afirmações de Bentinho são ambíguas e por isso você deve estar se questionando: A quem devo defender?

Essa desconfiança de Bentinho é fruto de sua péssima interpretação de fatos. A minha demora para engravidar é um problema genético. O meu filho de fato lembra Escobar quando o imita. Quanto ao fato de sua fisionomia ser parecida, eu também me pareço com a mãe de Sanncha, apesar de não termos mesmo grau de parentesco. Bentinho apresenta um ciúme doentio que o faz enxergar Escobar em Ezequiel. O livro não mostra minha versão, e por isso vim aqui provar para vocês a minha inocência, já que sabem apenas uma versão da história. E todas apresentam três versões: a minha, a dele e a verdadeira.

 

10 de setembro de 1900

Bentinho sempre desconfiou de mim, até mesmo quando éramos crianças. Ficamos um tempo separados na adolescência quando Bentinho foi para o seminário, onde conheceu Escobar. Na verdade, ele é totalmente inseguro, imaturo e o que falta nele é amor-próprio, já que ele nunca conseguiu aceitar no seu interior que uma mulher como eu possa gostar dele.

 

24 de setembro de 1900

Eu e Bentinho não conseguíamos ter filhos até a chegada de Ezequiel, que foi assim batizado por ser o primeiro nome de Escobar. Escobar era um atleta amador que gostava de nadar as vezes e durante um desses dias morreu afogado devido as fortes ondas. Bentinho foi quem encontrou o corpo, por isso não acredito tanto na história de afogamento, porque ele já estava com aquelas “caraminholas” em sua cabeça. No enterro, eu consolei minha amiga de infância Sanncha, a viúva de Escobar. Além disso, estava muito chateada com a morte de um amigo tão próximo. Até mesmo meu luto, Bentinho conseguiu enxergar com maus olhos.

 

30 de setembro de 1900

Tudo que eu fazia, Bentinho enxergava como uma prova de que eu havia o traído. Ele passou a ser chamado de Casmurro, por ser cabeça dura e teimoso. Além disso, ele é formado em Direito, e está preparado para persuadir qualquer pessoa em direção daquilo que ele acha correto.

 

5 de outubro de 1900

Bentinho disse que eu tinha “ideias atrevidas” desde os meus 14 anos. Isso só mostra que ele criou uma imagem negativa de mim em sua cabeça e esperava sempre o pior de mim. Mais de uma vez ele me descreve como “não confiável” e até dedicou um capítulo na obra que vocês leram que se chama Curiosidades de Capitu, onde ele afirma que eu tinha curiosidade em conhecer outras pessoas.

 

18 de outubro de 1900

Eu nunca gostei de beijar Bentinho em público, já que sou muito tímida e resguardada. Meu ex-marido se irritava apenas de imaginar eu o traindo. Na obra que vocês descobriram minha suposta traição, Bentinho demonstra sua atração por Sanncha, minha melhor amiga. Ele tentou suicídio por acreditar que eu de fato o traí.

 

22 de outubro de 1900

A mãe de Bentinho, Dona Gloria, prometeu que se seu filho sobrevivesse ao parto e aos primeiros anos de vida, ela o colocaria no seminário, fato que Bentinho sempre quis se desvencilhar. Dona Gloria já havia perdido outro filho antes de tê-lo, e por isso hoje acredito que o problema de engravidar estava nele, não em mim como ele afirma.

 

31 de outubro de 1900

Agora que eu contei a minha versão da história, vou falar a verdade. Vocês devem estar esperando a muito tempo por isso. Eu realmente traí Bentinho. Não fiquem chocados e nem me julguem como má pessoa. Eu apenas busquei me vingar de todo mal que ele me causou devido suas paranoias e inseguranças. Escobar era um homem incrível e a única coisa que me arrependo é de ter traído também minha amiga Sanncha. Nós éramos muito próximas desde a infância e imagino que tudo isso vai se perder quando eu publicar meu diário. No fim das contas, também desconfio que Bentinho me traiu com ela, já que na obra em que ele apresenta sua defesa, existe um capítulo em que ele demostra seu interesse por ela. O dia que Bentinho chegou da Ópera e encontrou Escobar na minha porta, foi a primeira vez em que nos beijamos. Por fim, deixarei o país após a publicação deste diário. Mas espero que as autoridades reanalisem a morte de Escobar, já que Bentinho tinha mais de uma razão para matá-lo: ele ser meu amante e ser esposo de sua nova paquera.

MACHADO DE ASSIS- UM RECOMEÇO

Manuela Garcia e Fernanda Coli - 2°A

 

Já se passara um ano e Capitu ainda não se acostumara ao frio. Outro ano em que sentia falta do abraço caloroso da brisa que soprava nas praias do Rio de janeiro, sensações que pareciam ter ocorrido décadas atrás. Tal abraço, no entanto, não poderia se comparar aos de sua companhia, seja de sua amiga ou de seu filho Ezequiel.

Sentada no sofá de sua casa, uma xícara de chá na mão e o fogo crepitando na lareira à sua frente, Capitu remoía as lembranças desse passado que lhe parecia tão distante. A sensação da brisa do mar já não era mais tão acolhedora, e as saudades foram logo substituídas pelas memórias daquela vida insossa e deprimente em que estivera por tanto tempo presa, até ser libertada por aquele anjo de olhos azuis que se sentava agora

ao seu lado.

Sua sorte, no entanto, não mudara do dia para a noite. Na verdade, a mudança começara há pouco mais de um ano e meio, em uma tarde na Rua da Glória, em que estava sentada à janela da casa fitando o horizonte e imersa em um mar de pensamentos. Foi quando uma figura irrompeu pela porta, já declarando:

- Capitu, apronte-se, pois hoje jantaremos na casa de Rubião.

A voz pertencia a Betinho, seu marido e amor de infância. Bentinho, com quem compartilhava a casa e a vida, que era constantemente regulada por ele. Rubião, na casa de quem aparentemente jantariam, era cliente do marido, que o auxiliara quando este recebera uma herança volumosa de um falecido amigo. Bentinho logo aproximara-se do

cliente, seja por sua pessoa ou pelo amontoado de dinheiro que lhe fora deixado.

- E lembre-se-continuou ele. Use aquele vestido que lhe comprei!

Como já havia dito, constantemente tendo a vida controlada pelo marido. O vestido não era de todo desagradável, feito de uma fazenda azul bonita e, claro, com longas mangas adornadas, com as quais já estava tão habituada que nem se importava com o calor escaldante da cidade. Era preferível, no entanto, aos rompantes de raiva passionais do

marido originados de sua desconfiança.

Já no jantar, Capitu se esforçava imensamente para não se entediar. Que não seja levada à mal: a comida estava divina, e Rubião era um anfitrião generoso. Mas as longas horas de conversa entre o marido e o cliente já faziam pesar suas pálpebras. Seu torpor, no entanto, foi quebrado pelo barulho de batidas à porta. Franziu a testa, confusa. Não esperavam mais companhia.

Mas todos os pensamentos se dissiparam quando a mulher mais linda que já vira passou pelo batente da porta. O mais impressionante, no entanto, eram seus olhos longos e azuis como o mar, em cuja imensidão imediatamente se perdeu. Seus próprios olhos já foram descritos como de cigana oblíqua e dissimulada, mas não poderiam se igualar

àqueles que a encaravam.

Se surpreendeu com os pensamentos. No entanto, não teve tempo suficiente de desenvolvê-los quando a mulher, igualmente confusa, desviou o olhar e, após cumprimentar os presentes, falou:

- Desculpe-nos pelo incômodo, não sabíamos que esperava visitas. Podemos retornar mais tarde, quando estiver desocupado.

Só então Capitu reparou na figura ao lado da mulher. “seu marido”, presumiu. Apesar da fala da mulher, Rubião insistiu para que ficassem, e o casal assim cedeu.

Só então foram formalmente apresentados: A mulher de olhos azuis chamava-se Sofia, enquanto o marido era Palha. O restante da refeição transcorreu sem outras surpresas, o que significava uma refeição silenciosa para ela, apenas tentando prestar atenção à conversa que se desenrolava na mesa.

Sofia permanecia igualmente calada. O que não impediu, no entanto, que as duas trocassem olhares. “Por ser a única outra companhia feminina na mesa”, pensou consigo mesma. Após o jantar, já na sala, Capitu deu início à conversa, elogiando o belo vestido vermelho e sem mangas da outra convidada. A conversa se desenvolveu rapidamente, e logo falávamos como amigas íntimas, como se já nos conhecêssemos há anos.

Não era, no entanto, de se espantar. Sofia era uma companhia agradável, com boa conversa e modos graciosos. Era, no entanto, uma criatura vaidosa e orgulhosa, como logo se percebia, o que era perdoável, seja devido à sua educação dentro dos círculos sociais da cidade ou às demais qualidades positivas que se sobrepunham a esses

aspectos.

Os meses se passaram e Capitu e Bentinho continuaram travando relações com Sofia e Palha, se tornando cada vez mais próximos. A maior intimidade, no entanto, se dava entre Sofia e Capitu, que costumavam passar grande parte dos seus dias na companhia uma da outra, conversando sobre tudo e, ao mesmo tempo, nada. Eram longas caminhadas pela praia, apenas as duas e o movimento da maré avançando e recuando sobre seus pés. Falavam sobre música, sobre a vida na cidade e entre os mais diversos assuntos, pelos quais perceberam que, além da origem em comum, as duas filhas de funcionários públicos, tinham muito a compartilhar.

Foi em um desses passeios que Capitu decidiu tirar o peso das costas e entregar os problemas ao mar, compartilhando suas mágoas com a amiga. Falou de Bentinho e de seu ciúme doentio, que parecia crescer mais a cada vez que olhava para o rosto do filho, que lembrava imensamente o de Escobar, amigo da família. A desconfiança fazia Capitu chegar ao limite, sem enxergar saída.

Ao ter o segredo de Capitu compartilhado, Sofia se sentiu confortável o suficiente para contar o dela. Como Capitu, enfrentava problemas no casamento, ainda que diferentes dos dela. Enquanto Bentinho escondia Capitu dos olhos alheios, Palha fazia de tudo para exibir a mulher que, por mais que tivesse um lado vaidoso, já se sentia incomodada

pela história que sempre se repetia. Amava Palha, sim, mas já estava cansada de ser um

adorno ao seu lado.

As mulheres se entreolharam na praia, histórias tão diferentes, mas ao mesmo tempo semelhantes. Daquele dia em diante, prometeram que não deixariam mais o lado uma da outra, as duas sentindo que não estavam mais sozinhas. Capitu segurou a mão de Sofia, dando-lhe um breve aperto de segurança, e assim ficaram por um momento, que pareceu uma eternidade.

A semana se passou rapidamente, e a sexta-feira chegou logo, quando Capitu e o marido iriam a um baile organizado na casa de Sofia. Por mais que estivesse ansiosa para a ocasião, a perspectiva de ver Sofia novamente lhe dava arrepios na coluna. Decidiu, no entanto, estoicamente ignorá-los e seguir para a comemoração. Não sei se pelo calor ou pelo súbito nervosismo, desenterrou um belíssimo vestido amarelo dourado de mangas curtas do fundo de seu armário, vestindo-o com um elegante casaco por cima.

O baile estava abarrotado de pessoas. No entanto, no momento em que seus olhos encontraram os de Sofia na multidão todos os demais desapareceram. Naquela noite, a mulher estava especialmente magnífica, e Capitu logo se apressou para cumprimentá-la.

Alguém, no entanto, lhe impediu.

Esse alguém era seu marido, que só percebera agora, ao deixarem os pertences na entrada, que a mulher havia retirado o casaco e exibia os braços expostos para todos os olhares de dentro da casa. Só então Capitu percebera o seu erro, mas não estava, de forma nenhuma, arrependida. Já estava mais que farta do controle e da desconfiança de Bentinho, e não cederia outra vez aos seus caprichos.

Quando percebeu sua resistência, no entanto, o brilho sumiu dos olhos do marido, substituído por alguma emoção voraz, que fez-lhe apertar o braço com mais força. Nada parecido com o menino tímido que conhecera na Matacavalos, em sua casa de infância.

Sem conseguir me soltar, varri os olhos pelo salão à procura de algum anjo salvador, que na sua cabeça se materializava com aqueles olhos azuis que já avistara mais cedo. A dona daqueles olhos, que também observava pela residência como que buscando alguém, logo sentiu o olhar, e foi ao seu socorro, dizendo:

- Capitu, estava te esperando! Adoraria lhe mostrar o novo canteiro de rosas do jardim, está magnífico à luz da lua!

Bentinho, remexendo-se desconfortável, disse:

- Agradecemos a gentileza, mas já estávamos de saída.

Ao que Sofia respondeu, com um franzir da testa:

- Ora, mas acabaram de chegar! Há algo de errado?

E antes que o homem pudesse responder, acrescentou

- Por favor, insisto que fiquem! Bentinho, por que não se junta a Palha? Meu marido está tomando um vinho maravilhoso, e tenho certeza de que adoraria alguma companhia! Enquanto isso entretenho Capitu no jardim.

Sem deixar espaço para discussão, Sofia tomou a mão de Capitu e guiou-a pela festa, perdendo-se na multidão. Já no jardim, sem mais ninguém à vista, Sofia soltou-lhe a mão e perguntou-lhe o que acontecera. Capitu agradeceu-lhe e explicou a situação.

Sofia, de olhos arregalados e com o rosto vermelho, uma veia pulsando na testa,

respondeu, irada:

- Quanta ousadia! Como se atreve a agir com você desta maneira? Voltarei agora

lá para dentro e o expulsarei pessoalmente de minha casa! Quanta ousadia- repetiu, balançando a cabeça.

Capitu, temendo as consequências daquele ato, que poderiam ir muito além do vexame, se colocou no caminho da amiga.

- Sofia, eu te imploro, não faça nada impensado! Fique aqui, se acalme, ou acabará fazendo algo de que se arrependerá depois!

Mas Sofia, aparentemente, não tinha nenhuma intenção em se se acalmar. Pelo contrário, desvencilhou-se das mãos da outra e seguiu para a casa, batendo os pés.

Capitu, apressou-se para detê-la, agarrando outra vez suas mãos e puxando-a para si.

Não pôde deixar de reparar nos lindos olhos azuis, brilhantes à luz do luar, ou na pequena distância que agora as separava. E, em uma reação de impulso, impensada, aproximou o rosto e tocou-lhe os lábios.

Foi um beijo rápido, mas intenso, interrompido quando Sofia lhe deu um empurrão.

Essa tocou os lábios, e olhou-a com surpresa estampada nos olhos. Capitu, subitamente percebendo o que fizera, corou da cabeça aos pés, murmurou um pedido de desculpas e saiu do jardim às pressas, quase correndo. Sofia continuava parada, atônita, incapaz de se mexer e murmurou, consigo:

- Então você também se sente assim?

Capitu não conseguia lembrar direito como chegara em casa. Voltara trêmula, repassando várias vezes na cabeça a cena do jardim. Quando chegaram ao lar, Ezequiel, seu filho, já dormia, e Capitu sentou-se à janela, contemplando o mar, como sempre o fazia. Que vexame! Jamais conseguiria olhar para Sofia outra vez! Mudaria de rua, casa, o que quer que fosse preciso, mas jamais conseguiria falar com a mulher outra vez.

Fora dormir com tais pensamentos na cabeça, vagamente ciente de Bentinho, que se remoía em suas próprias mágoas ao seu lado. Mal o dia raiou, o marido já se enfurnara no escritório, saindo apenas na hora na refeição.

À mesa, predominava um silêncio constrangedor, e Capitu não pôde deixar de notar o olhar estranho do marido. Mas logo o atribuiu à noite anterior, e não se preocupou mais com isso. O silêncio só foi quebrado por Ezequiel, quando anunciou que o leite havia acabado. Bentinho, mais que prontamente, se ofereceu para buscar mais na cozinha.

Percebendo uma oportunidade de discutir o que ocorrera com o marido, Capitu segui-o.

Qual foi a sua surpresa, no entanto, quando flagrou-o despejando o conteúdo de um pequeno frasco na caneca do filho, indagando-o:

- O que está fazendo?

Ao ser surpreendido, Bentinho teve um sobressalto, soltando a xícara, que se estatelou no chão em mil pedaços. Capitu repetiu a pergunta, a que Bentinho respondeu admitindo o crime que estava a cometer.

Não admitiu apenas isso, no entanto. Admitiu que desconfiava que o filho não era seu, mas sim do falecido amigo Escobar. Admitiu que pensava ter flagrado olhares entre os dois, flagrado a mulher pensando nele quando olhava contemplativa para o mar e confirmado suas teorias quando se demorara mais ao caixão do amigo do que o

apropriado. E, já louco com aquela história, planejara envenenar o filho, que carregava em suas feições os traços de Escobar.

Capitu só podia ouvir, atônita, enquanto a história se desenrolava. Ao fim da explicação, continuou parada, processando a informação, incapaz de se mover. Com o silêncio da mulher, Bentinho avançou um passo, o cenho franzido.

- Capitu...

O homem não teve tempo de reagir quando ela, subitamente, agarrou um dos pratos de porcelana ao alcance na mão e o atirou em sua direção. O objeto se quebrou na parede ao lado, por pouco não acertando a sua cabeça.

Foi então que começou a gritar. Capitu despejou toda a sua ira naquela cozinha, quebrando objetos independentemente de sua beleza ou valor. Xingou-o de todos os nomes possíveis, dizendo-lhe que era um louco por inventar aquela história dentro de sua cabeça. Bentinho, à menção desse último comentário, berrou:

- Então nega que me traiu?

Capitu, mal pesando as palavras, berrou de volta:

- Se quer mesmo saber, o filho é seu, e a semelhança com Escobar é mera coincidência.

Mas já que quer tanto saber, te traí sim, mas não foi com Escobar, ou com qualquer outro homem que sua mente perturbada tenha criado: foi com Sofia!

As palavras saíram cruas, sem pensar. E Capitu arrependeu-se no memento em as proferiu. Mas percebeu, no entanto, que eram verdadeiras: não o traíra pela cena no jardim, mas por todas aquelas horas juntas, e por aquele sentimento que nutria pela mulher, o que por si só já era uma infidelidade. Bentinho parecia igualmente incrédulo,

e foi a vez de Capitu de confessar.

Confessou a infelicidade, o sentimento de prisão que aquela vida lhe impunha, e que fora aliviado pela presença da amiga. Confessou os últimos meses, as caminhadas na praia, o beijo no jardim. O marido apenas assentiu, incapaz de se pronunciar.

Depois disso, se deu mais uma série de discussões, e ao final definiram que a melhor solução era se separar. Bentinho continuaria no Rio de Janeiro, mas pagaria pela viagem da esposa à Europa, onde passaria o resto de seus dias com o filho. Todos os incidentes ficariam entre eles, e a história toda seria esquecida.

Capitu, decidida, voltou à sala, tomou o filho pela mão e, juntando rapidamente alguns pertences, saiu batendo os pés pela porta da frente. Já sabia para onde ir, e o vexame da noite anterior já se tornara um acontecimento secundário.

A mulher já ensaiava na cabeça o que diria à Sofia. Confessaria tudo, a discussão, seus sentimentos, a ida à Europa. No fundo, esperava que se juntasse à ela naquela viagem e aventura final, mas não ousou fantasiar muito sobre aquilo.

Não poderia em nenhum universo, no entanto, ter imaginado a cena que desenrolava à sua frente quando chegou à casa de Sofia. A mulher estava parada no batente na porta, uma mala aos seus pés e uma expressão determinada no rosto. Quando viu Capitu se aproximar com o filho, a amiga, ou o que quer que fosse, correu em sua direção para

abraçá-la.

Sofia não perdeu tempo. Explicou-lhe que, na noite do jardim, percebera os sentimentos que nutria por Capitu, e, mais que isso, que não Palha além de um interesse superficial e de um amor mais idealizado do que real. Decidira então que já estava farta daquela vida, e que procuraria um recomeço em algum outro lugar, de preferência em companhia de Capitu.

Capitu contou o próprio lado da história, e que em algumas semanas planejava embarcar, permanentemente, para a Europa. Sofia assentiu, com tristeza brilhando naqueles olhos azuis. O sentimento, no entanto, durou apenas um momento, e a mulher levantou o olhar, agora determinado e, encarando-a diretamente, disse que, aonde quer

que fosse, a seguiria.

Algumas semanas depois, como prometido, as duas embarcaram em um navio com destino a Portugal. De lá, seguiram para os demais países, maravilhando-se com a beleza e os esplendores do continente. O mais impressionante, no entanto, foi a França, onde as mulheres maravilharam-se com a origem de tantas das modas dos círculos sociais da cidade.

Decidiram então se estabelecer na Suíça, onde agora Capitu remoía as memórias sentada ao lado de Sofia e do filho. Sorriu consigo mesma. Um recomeço, era o que aquilo era. E ela não deixaria nem mesmo o clima congelante estragar aquilo.

Monólogo Dramático – 3º ano EM

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O monólogo dramático é um gênero literário que trabalha com a exploração das máscaras e vozes poéticas: personagens secundários, marginais, fictícios e até animais compõem vozes da poesia clássica e contemporânea. Os alunos do 3º ano do Ensino Médio foram convidados a exercitar essa observação sobre o papel do eu-lírico nos poemas por meio da elaboração de um monólogo dramático autoral. Para isso, em aula, lemos e compartilhamos interpretações sobre os poemas A mulher de Lot (Wislawa Szymborska), Um boi vê os homens (Carlos Drummond de Andrade), Uma baleia vê os homens (Antônio Tabucchi), Quadrilha (Carlos Drummond de Andrade) e Os três mal amados (João Cabral de Melo Neto). Atividade inspirada no vídeo Oficina #1: Poesia com Marília Garcia.

Nhanina

Amanda Felgueiras

 

Meu marido me batia, e ele se matou

Meus filhos eram minha alegria, que se esgotou

A meus filhos... minha maior prioridade

Perdi meu menor para uma doença, outro para a cidade.

 

Meu sonho é ver o mar, amar

Meu sonho é ser feliz e sonhar

Mas acho que vou continuar sonhando

Enquanto minha vida vai passando.

A macieira de Newton

Gabriel Bari

 

Me via todos os dias a enxergar

O homem que vivia ao lado

Na minha sombra se deitar

Sempre com algo a sua mão com se estivesse colado

 

Porém um dia ele se impressionou

Com algo que para mim é tão pequeno

Ele reparou numa simples maçã que de mim despencou

E com essa situação ele não se encontrava mais sereno

 

Ele se viu a tentar entender algo que para mim era óbvio

Uma maçã se soltou de mim indo direto ao chão

E ele insistia na busca de um desanuvio

 

Eu não acreditava como alguém pode ter tanta dedicação

Para se fechar em seu convívio

Como se aquilo fosse mudar toda civilização

Anaíde Beiriz

Lia Felgueiras

 

Nasci, cresci, mas não noivei

As cartas que deixei

São provas de minha existência

Não preciso de condolência

 

Sou lembrada pelo meu caso de amor

Mas também fui professora, educadora

Batalhadora e escritora

Paraíba masculina, mulher-macho, sim senhor!

 

Nossa luta foi definida

O sufrágio não é mais um problema

A voz das mulheres agora é ouvida

 

Pude encontrar a paz e justiça

Ao dizer adeus a esse mundo

E agora o que me resta é a lembrança

Paixão e histeria

Anna Luísa Lambiasi

 

Estava eu sozinha em meu quarto

A única coisa que conseguia fazer era pensar

Meu coração estava acelerado

Eu não podia negar

Era ele que estava a chegar

 

Meus braços e pernas não se moviam

Até onde isso chegaria?

Aquelas nuvens em minha cabeça me impediam

Eu não comia e nem bebia

 

Em minha boca uma secura

Uma tosse insistia

O sintoma que perdura

Ele dizia que era histeria

 

Eu olhava para fora

Ele me fazia olhar para dentro

Cobras eram o que eu via agora

Quando será que termina esse tormento?

Cleópatra

Isabel Miki

 

Dizem que me matei por orgulho;

Talvez só não estivesse em um dia bom;

Imersa nas imensas profundidades do “eu”;

Perdida em suas diversas ondas;

 

Dizem que me matei por homens;

Talvez não me agradassem na cama;

Ou fossem feios demais para mim;

Viver como uma Vênus tem seus fardos;

 

Dizem que me matei por cansaço;

Dos mesmos homens mandado e desmandando;

De me ver com as mãos atadas;

De mim mesma;

 

Dizem que me matei pela ambição;

De ansiar a felicidade;

Do desejo pelo poder;

Da utopia.

Eu sou a ferocidade

Luigi Genioli

 

Cheguei...

Parei o mundo

De um modo diferente

Deleguei...

 

À Saúde

À Sociedade

À Educação

À Economia

 

Isolamento

Medo

Crise

Negligência

 

Enfrentamento

Resiliência

Solidariedade

Benevolência

 

Declarei emergência

Desafiei a Ciência

Alterei as rotinas insanas

Exigi eficiência

 

O mundo não será mais o mesmo

Após minha passagem

Seres humanos repensarão

Ações e crueldades

 

Não vim para ficar

Mas sim elucidar

De uma forma dolorosa

O verdadeiro significado

Do que é moderar a vida

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